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Elevando o Caráter de Deus: "Não tomarás o nome do Senhor, teu Deus, em vão"

Por Peter Goeman
Professor de Hebraico e Antigo Testamento (Shepherds Theological Seminary)
Publicado em 2 de fevereiro de 2020

O primeiro mandamento afirma que Deus deve ocupar posição suprema acima de toda a criação; nada e ninguém deve ser elevado acima da posição de Deus. O segundo mandamento declara que Deus não deve ser rebaixado à posição ordinária da criação. Juntos, esses dois mandamentos destacam a posição devida que Deus deve ocupar. Agora, chegamos ao terceiro mandamento: Não tomarás o nome do SENHOR, teu Deus, em vão, porque o SENHOR não terá por inocente o que tomar o seu nome em vão.

Desde criança, fui ensinado que esse mandamento se refere primariamente a proferir o nome de Deus em vão (ou seja, não devemos inserir o nome de Deus em gírias, piadas, etc.). Contudo, no mundo bíblico, o nome representava o indivíduo, sendo sinônimo do seu caráter. Por isso, vemos Esaú sendo chamado de “Edom” porque comeu comida vermelha (Gênesis 25.30), e o Anjo do Senhor dando a Jacó o nome “Israel” por causa de sua função no plano de Deus (Gênesis 32.27–28; 35.10). Em essência, o nome é sinônimo daquilo que a pessoa é. Na realidade, havia uma crença comum de que algo não existia até que recebesse um nome.

Além disso, em situações nas quais votos eram feitos, as pessoas os faziam em nome de algum deus. A expectativa era a de que, se fizesse um voto em nome daquele determinado deus, você invocava aquele deus para cobrá-lo pelo voto realizado. Se violasse o voto ou o fizesse com engano, o deus invocado supostamente o puniria segundo seu poder. Hoje em dia, geralmente não fazemos promessas e votos assim. Porém, talvez você já tenha ouvido pessoas utilizando um sistema semelhante. Por exemplo, alguém que deseja fazer uma promessa séria pode dizer: “Eu juro! Juro sobre o túmulo da minha mãe.” A implicação lógica é que o valor daquela pessoa especial garante a veracidade do que é dito. Caso não cumpra o que diz ou o que diz for mentira, você mancha a reputação da pessoa que invocou durante o voto ou juramento.

É com esse pano de fundo que conseguimos compreender a intenção do terceiro mandamento em sua totalidade. O terceiro mandamento proíbe tratar o caráter de Deus com leviandade e desonra-lo. Evidentemente, a base do mandamento é o fato de Deus ser aquilo que alega ser. Ele é o único Deus verdadeiro; ele possui toda glória e poder, os quais demonstrou através da criação (Gênesis 1–3).

A mensagem central desse mandamento se manifesta de diversas maneiras. Um dos exemplos positivos de obediência ao mandamento aparece em Josué 9. Na ocasião, os gibeonitas enganaram os israelitas e fizeram uma aliança com eles. Quando os israelitas descobriram o engodo, eles cogitaram a possibilidade de revogar a aliança. Entretanto, como lemos em Josué 9.18: Os filhos de Israel não os feriram, porquanto os príncipes da congregação lhes juraram pelo SENHOR, Deus de Israel. Os israelitas reconheceram que, pelo fato de terem prometido segurança aos gibeonitas em nome do Senhor, eles estavam obrigados a cumprir o juramento com base naquilo que o Senhor era.

A estrutura do terceiro mandamento também lança luz em seu significado. A ênfase recai não sobre a ordem em si, mas no castigo por sua violação. O verso segue uma estrutura quiástica, ou seja, o padrão A-B-A’:

A: Não tomarás o nome do Senhor, teu Deus, em vão…

B: porque o Senhor não terá por inocente…

A’: o que tomar o seu nome em vão.

Numa estrutura de quiasmo, a parte central é a essencial. Assim, Deus destaca a culpa daqueles que desobedecem a esse mandamento. Trata-se aqui de uma advertência grave aos que não compreendem a natureza verdadeira do poder e soberania do Senhor. Dessa forma, os que invocam o caráter de Deus no que realizam devem estar cientes de que existem consequência severas envolvidas.

É interessante analisar como a teologia completa desse mandamento se desdobra. Na época de Jesus, os rabinos judeus haviam desenvolvido um sistema de votos que lhes permitia jurar pelo céu ou pela terra; se violassem o juramento, não seriam culpados. Os judeus evitavam fazer juramentos usando o nome do Senhor para não correrem o risco de se tornarem culpados (Mateus 5.33). No entanto, Jesus ensina que nossa palavra dever ser “sim” ou “não” (Mateus 5.37). Ao falar isso, ele corrige um entendimento inadequado do terceiro mandamento. Ao mesmo tempo, ele ressalta que os que estão associados com o Senhor representam o caráter de Deus em toda sua fala.

Assim como o restante de Mateus 5, Jesus Cristo repreende os que aplicam a intenção da Lei de forma incompleta. A verdadeira aplicação é que tudo quanto o crente faz é um reflexo do Deus com ele associado. Dessa forma, quando falamos com falsidade, manchamos o caráter de Deus; quando falamos a verdade, representamos o nome do Senhor como devido. No fim, apesar de o terceiro mandamento lidar especificamente com juramentos e votos, a intenção vai muito além do discurso apenas e engloba a vida do indivíduo em sua inteireza. Devemos representar o Senhor em tudo quanto fazemos.

Lembro da história triste de um indivíduo famoso numa cidade que estava sendo julgado por roubo. Durante uma sessão no tribunal, ele afirmou enquanto se defendia: “Eu sou cristão e cristãos não fazem esse tipo de coisa!” Posteriormente, ele admitiu ter desviado dinheiro e difamado Aquele que alegava representar. O terceiro mandamento se aplica a nós crentes hoje não porque é parte dos Dez Mandamentos, mas porque ainda representamos Deus e nossas ações refletem como enxergamos seu caráter.

Quando for tentado a pecar, medite no fato de que suas ações refletem sua perspectiva de Deus.

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